Em 2007, o
espetáculo de clown Slava’s SnowShow – de Vyacheslav Ivanovich (Slava) Polunin – veio ao Brasil. Eu li as
críticas no jornal e fiquei maravilhada e decidi: preciso ver isso! No entanto,
não tinha dinheiro para comprar o ingresso. Fiquei sabendo que uma grande rádio
estava oferecendo convites para os ouvintes. Passei uma semana inteira ligando
até que (acreditem!) eu consegui. O ingresso era para o último lugar da última
fileira, mas apesar disso ainda me senti privilegiada. Foi um dos espetáculos
mais lúdicos e delicados que assisti. Naquela época, tudo estava tão “cinza” na
minha vida que toda aquela explosão de cor e luz me transformou.
Passei anos pensando em como
seria bom estudar a arte do clown (palhaço). Nunca consegui fazer um curso.
Sempre havia um problema: ou era caro demais, ou as datas e horários não eram
compatíveis... No entanto, não desisti: segui estudando pela internet... Vi os
vídeos de Polunin... Do Licedei... Passei a pesquisar textos acadêmicos sobre o
assunto... Salvei imagens... Rascunhei ideias... Até que em 2011 tive a
oportunidade de colocar as minhas pesquisas em ação pela primeira vez. Ofertei
algumas pantomimas e dei meu primeiro passo (tímido, mas amoroso). Em 2012, um
novo desafio: um grupo de jovens queria conhecer a arte do clown e resolvi
dividir o pouco que sabia. Resultado: eu e eles estamos estudando juntos,
testando, experimentando, compartilhando erros e acertos sobre como trilhar os caminhos
de ser palhaço...
Apesar de
reconhecer que a arte do palhaço se constrói originalmente no “riso”, nunca me
esqueci da questão lúdica apresentada por Polunin... Assim como muitas pessoas,
achava que palhaço “de verdade”, “tem que” fazer gestos grandes, “tem que”
fazer rir, “tem que” ser exagerado, “tem que” falar. Pensar assim é limitar a
arte do clown. Graças ao Polunin, descobri que gestos minimalistas podem
conquistar uma plateia. Que palhaço também chorar, mas de encantamento. Que
gestos são tão ou mais importantes que palavras...
Ontem, depois de 6 anos
(06/07/2013), vi novamente o espetáculo Slava’s SnowShow. Mais uma vez o preço
do ingresso me colocou num lugar nada promissor: no balcão. Longe do palco,
longe da teia, longe da tempestade, longe dos palhaços... Polunin não estava no elenco da apresentação,
mas ainda sim, foi delicioso! A trupe é ótima.
Em casa, minutos antes de sair,
escrevi uma carta para Polunin e sua trupe. A entrega da mensagem foi uma
verdadeira “Odisseia”! Sacudi do balcão, tentei fazer um “aviãozinho” e lançar,
arrisquei pedir ajuda de alguém da plateia para deixar a carta no palco, mas
nada! Então, na fé e na coragem, desci, invadi a plateia e cheguei perto do
palco com o meu “bilhetinho” de 1 metro que dizia mais ou menos assim:
“Dear Polunin, thanks for inspire me to be a
clown. I watched your show in 2007. I'm practicing the clown art with a group
of teenagers. Could you give us some advice? All our the best hugs! Priscila ( e o nome de todos os jovens que estudam clown comigo).”
Um dos palhaços recebeu, e todos
leram a carta no palco. Recebi a promessa que entregariam a carta ao Polunin.
Por sorte, meu noivo fotografou
(como pode!) esse instante improvisado e espontâneo...
Com a carta nas mãos... |
Carta no chão e leitura rápida... |
A breve conversa.. |
Carta no peito e a promessa da entrega =0) |
P.S. Em 2011 descobri que os
artistas do grafite, Gustavo e Otávio (OsGêmeos), haviam feito uma bela obra de arte na casa de
Polunin, na França. Escrevi uma mensagem para eles pedindo que enviassem um “beijo
de borboleta” para ele. E não é que eles responderam ao meu pedido? =)
***
Depois que escrevi esse post, recebi um e-mail de meu noivo com uma linda prosa poética sobre o dia de ontem. Decidi compartilhar:
"Rio, 07 de julho de
2013 (domingo).
Você, D. Quixote
Slava’s Snow Show. Teatro Bradesco, Village Mall.
O fim de uma apresentação bonita e poética, num êxtase, com bolas gigantes
quicando sobre a plateia e Blue Canary
tocando. Nós no balcão nobre, muito longe do palco e da chuva de papel picado
que fazia as vezes de “neve”, enquanto os palhaços brincavam com a plateia que
se retirava. E eis que vejo você, com olhos marejados, pegar o cartaz que fez
com as crianças da Evangelização do GEAF e, sozinha, ir para a frente do balcão
tentar, com pulos e acenos, fazer alguém do palco notar que você tinha algo
para eles. Eu fiquei atrás, segurando nossas coisas, surpreso e comovido com
sua coragem e seu esforço. E cheguei a pensar, confesso, que era um esforço de
uma Quixote-menina, pequena e desesperada, tentando se fazer notar pelo mundo.
Lá embaixo, as bolas coloridas faziam a alegria de adultos e crianças, mas
também formavam uma barreira entre seu alvo e o cartaz feito com tanto carinho.
Naquele momento, você era fã e também mensageira do esforço de um bando de
meninos e jovens tentando descobrir o que é a arte, um legado importante demais
para se limitar ao protocolo de uma plateia bem comportada.
Notei que podíamos tentar entrar na área da plateia baixa, e você
disparou na minha frente, salto alto e tudo. Felizmente, os palhaços estavam
ainda no palco, brincando e fazendo brincar, como num espetáculo após o
espetáculo. Perdi você de vista por um momento, no meio da multidão em volta,
mas logo a acho: na beira do palco, pequenina, o cartaz aberto, gesticulando
rápida e aflitamente para um dos palhaços. Ele nota, aproxima-se e vocês se
comunicam por gestos — a linguagem universal dos clowns de toda a Terra. Fico observando, uns passos atrás, e só
posso imaginar como você se sentiu quando ele veio e falou com você. E logo
vocês estão fazendo mímicas, primeiro um ratinho, depois uma dancinha, como se
fossem velhos amigos. Dei-me conta, então, que estava presenciando a realização
de um sonho, como o “sonho dentro do sonho” de Poe, só que agora um deles era
real. A carta estava entregue, uma promessa havia sido feita e, quem sabe, um
novo sonho começava a surgir.
E que ele possa se realizar também. Pois hoje eu acredito um pouco mais
em sonhos que se fazem reais.
R."
0 comentários:
Postar um comentário